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terça-feira, 14 de outubro de 2014



POEMA DA AUTO-ESTRADA,  ANTÓNIO GEDEÃO






Voando vai para a praia

Leonor na estrada preta

vai na brasa, de lambreta.
___

Leva calções de pirata,

vermelho de alizarina,

modelando a coxa fina

de impaciente nervura.

Como guache lustroso,

amarelo de indantreno

blusinha de terileno

desfraldada na cintura.
___

Fuge, fuge, Leonoreta.

Vai na brasa, de lambreta.

Agarrada ao companheiro

na volúpia da escapada

pincha no banco traseiro

em cada volta da estrada.

Grita de medo fingido,

que o receio não é com ela,

mas por amor e cautela

abraça-o pela cintura.
___

Vai ditosa, e bem segura.

Como um rasgão na paisagem

corta a lambreta afiada,

engole as bermas da estrada

e a rumorosa folhagem.

Urrando, estremece a terra,

bramir de rinoceronte,

enfia pelo  horizonte

como um punhal que se enterra.

Tudo foge à sua volta,

o céu, as nuvens, as casas,

e com os bramidos que solta

lembra um demónio com asas.
___

Na confusão dos sentidos

já nem percebe, Leonor,

se o que lhe chega aos ouvidos

são ecos de amor perdidos

se os rugidos do motor.
___

Fuge, fuge, Leonoreta

vai na brasa, de lambreta.

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